O Ironman do WP cearense
Agora ele superou um desafio "impossível". Ou melhor, um desafio que parecia impossível antes de ser superado. Contrariando todas as suas dificuldades e inabilidades, principalmente na corrida, o Kal se realizou ao completar o Ironman de Santa Catarina. Leia abaxo texto escrito pelo Kal explicando o que significou para ele essa conquista.
Fica o exemplo pra todos os que não acreditam.
UM SONHO DE CRIANÇA
Desde quando lembro ainda criança, que qualquer coisa, eu disse tudo que seja relacionado a esporte competitivo, me chamava mais atenção do que qualquer brinquedo ou travessura infantil, lembro ainda com meus 7, 8 anos de idade que já adquiria exemplar de revista de futebol e acompanhava seguindo a tabela e somando pontos. Formula 1, sempre foi o melhor programa de domingo até então, comecei na natação e no judô, fazia os dois esportes na mesma pequena academia, mas achava chato, queria somente competir, lutei em vários campeonatos estaduais de judô, mas a natação foi quem me sugou, acredito ter tido sempre uma facilidade natural para nadar, não era dos mais esforçados mas obtinha os resultados esperados naquelas competições infantis, aniversário dos amiguinhos em que tinha competição de natação naquelas piscinas residenciais eram sempre formas de obter sucesso entre as pequenas, uh, como era gostoso tudo aquilo.
Na adolescência, descobri um esporte que me chamou muita atenção, era o Triathlon, sempre acompanhava através de revistas e então descobri que existia uma prova chamada IRONMAN, ao saber das distâncias ( 3,8km de natação-180km de ciclismo e 42km de corrida ) a serem percorridas sempre visualizei como um projeto futuro e que seria o ápice que um desportista poderia alcançar, terminar um Ironman! Ainda na natação, treinando pouco e sendo expulso da piscina de vez em quando, resolvi começar a correr para uma possível estréia naquele esporte tão distante, foi aí que percebi que as distâncias era bem maiores do que sempre pensei, não tinha o menor jeito para correr, não conseguia o menor sincronismo para aquele esporte e desisti, continuei na natação, sempre praticando outros esportes como o basquete, Jiu-jitsu, pólo aquático, tênis e até futebol americano, todos a nível competitivo, vale lembrar que sou turfista de carteirinha, ou seja, qualquer coisa que envolva competição é comigo mesmo!
Estávamos no ano de 1991, após 12 meses de intercâmbio cultural e recém casado, tentei meu primeiro triathlon, era um bem curto, nas distâncias 500 metros de natação, 20km de ciclismo e 3km correndo, treinei pouco e fui para a largada com uma mountain bike de ferro, foi uma grande decepção, naquela época tinha assinatura da revista especializada e sabia os nomes de campeões renomados, além de ser um espectador das provas locais.Voltando a estréia, na transição da natação para o ciclismo eu já era um homem quase morto, os batimentos na boca, os amigos gritando na areia e eu sem a mínima condição de reagir, mal consegui terminar o pedal, andei uns 800 metros e desisti, lembro até hoje da minha mãe e amigos me esperando e vendo eu voltar acabado, foi uma coisa muito forte , era um atleta acostumado a estar sempre nos pódios e na ocasião fui o único a não terminar aquele minúsculo triathlon, o Ironman parecia cada vez mais distante.
Os anos passaram, com eles vieram meus filhos, muitos cabelos brancos, precoces por sinal e a contínua vontade de me tornar um Ironman, é difícil explicar como este título passou a ser importante para mim, continuava nadando, fui por diversas vezes campeão estadual, brasileiro, vice sul americano, vice olímpico máster no Canadá mas existia aquele pensamento de que faltava alguma coisa, lá estava aquele desafio sempre em minha cabeça, foi aí que comecei a participar de provas de revezamento de triathlon, eu só nadava e sempre encontrava alguém para pedalar e correr, sempre muito cansado observava aqueles que faziam a prova completa e ficava a pensar como é que estes caras conseguem? E olha que era triathlon short ou olímpico. Tomei coragem e me inscrevi para uma prova completa de duathlon (nadar e correr), querem saber, fui o primeiro a sair da água e todos, eu disse todos os atletas que eu venci no mar me passaram na corrida.
Meu primeiro objetivo era correr 3km, sempre pensava, como uma pessoa que nada travessia em mar aberto com mais de 3km não corre a mesma distância, a coisa começou a fluir, cheguei aos 3, depois 4,5 e lembro bem do dia que corri 6km, no “maravilhoso tempo de 47 minutos”, verdade, chegava a ter vergonha de correr na Av. Beira Mar devido a dificuldade, amigos me passavam e perguntavam: - Trotando?
Até que comprei uma bike usada importada, dois dias depois lá estava eu juntando uns 10 amigos triatletas para competir num short triathlon particular, completei a duras penas em último e perdendo para uma mulher iniciante, ela me passou na corrida, é claro! Daí em diante fiz umas 3 provas oficiais, todas curtas, duas fora do estado e sempre durante as provas ficava a pensar, se estou completamente cansado aqui, como posso pensar em Ironman?
Dia 02 de janeiro de 2007, pesando 87 quilos tracei o objetivo de fazer o Ironman no dia 27 de maio do corrente ano, tinha cinco meses para sair dos 40km de ciclismo a que estava acostumado para 180km e o pior, sair dos 7 ou 8km que corria para 42km.
Era um plano bem ousado, muitos me desencorajavam, outros tinham certeza de que eu jamais conseguiria, a coisa passou a ser quase uma paranóia, passei a viver para o Ironman, troquei de bike, contratei personal trainer, treinador, nutricionista e me dediquei de corpo e alma, como se sabe “quanto mais você sua nos treinamentos, menos sangra no campo de batalha”,olheiras eram constantes, pois passei a acordar 4:30 da manhã constantemente, tinha que correr, pedalar, nadar e fazer musculação de forma intensa, dizem que a preparação para um ironman dever percorrer pelo menos 1 ano, a minha duraria 5 meses, os dias passaram, os quilos se foram de forma rápida, perfazendo 10 no dia da prova, ou seja, 77kg.Foram muitos os obstáculos, conciliar trabalhos, obrigação de pai, atenção a namorada, distância dos amigos, cerveja, noitadas, ou seja, tive que deixar muita coisa de lado e desviar toda minha atenção aquele que na minha ótica sempre foi meu grande objetivo como atleta, somente sabe a rotina de um treinamento para o ironman, quem um dia já fez, não é possível explicar tamanha dedicação e esforço, chegar a passar 6 horas em cima de uma bicicleta, correr por 3 horas seguidas, nadar no mar constantemente, as vezes sozinho, arranjar tempo para musculação, sem falar na quantidade de comprimidos que se ingere diariamente, muitos devido a uma condromalácia no joelho esquerdo, na verdade soube disso logo após o início do treinamento em janeiro, devido a uma má formação do joelho estava com um grande desgaste das articulações naquele local e segundo advertências médicas somente poderia voltar a correr após um trabalho intenso de musculação para reforço da musculatura ao redor da patela, continuei a correr com dor e sem dizer a ninguém, segui a musculação certinha, sempre bem aplicado e as dores foram diminuindo, bem como o desempenho foi melhorando demasiadamente.
Os treinos foram aumentando e a ansiosidade também, sempre que corria nos treinos viajava no pensamento como se estivesse na prova e acreditem, me emocionava, era o efeito daquele monstro de 226km em que teria que percorrer nadando, pedalando e correndo e que devido a tamanho desprendimento não me perdoava em não conseguir terminar. Viajei a Florianópolis com dois pensamentos, treinei o máximo que poderia ter treinado e só desisto se desmaiar durante a prova! Alguns pensamentos e frases famosas sempre me vinham a cabeça tais como “ A disciplina é a ponte que liga nossos sonhos ás nossas realizações” .
Dia 27 de maio de 2007, vale lembrar que o cuidado para com este desafio era tão grande que até escolhi o número que queria competir, 724, uma junção de 72 (ano de nascimento ) e 24 ( dia do nascimento ), tenho estes números como uma espécie de talismã e notem que a prova foi disputada no dia 27 de 2007, ao contrário, seria 72...
Eram 4:35 da manhã, sou acordado com o telefonema do meu companheiro de treino e que estava hospedado no apto ao lado dizendo que não faria a prova, estava doente já por 3 dias e tinha piorado, notícia que me deixou deverás perturbado, fui para a prova, na largada, não contive as lágrimas, lá estava eu a 5 minutos de largar para o Ironman! Nadei confortavelmente, batendo pouca perna, muitos me incentivaram a fazer uma prova forte e sair entre os primeiros da água, mas respeitei demais o percurso e sabia o quanto havia pela frente, entre 1250 participantes, fui o 51º a sair do mar, poderia sim ter ficado entre os 20 ou 10 primeiros, mas certamente iria me desgastar para a longa estrada que ainda teria a seguir.Minhas transições duraram em média 15 minutos, coisa de principiante mesmo, comecei a pedalar e muita, muita gente me passou, não me abalei e fiz minha média, rezava muito para não furar um pneu pois não tinha tantas habilidades para a troca, de vez em quando as lágrimas passeavam pelo meu rosto inexplicavelmente, é o que o Ironman faz com você! Foi um longo passeio de 6 horas e 45 minutos aproximadamente sem a transição, ao entregar a bike, pernas bambas, vista embaçada mas jamais desistir, jamais! Fiz tanto por merecer que não permitiria que nada tirasse o que busquei com tanta luta.
Saí para correr e com 2km, passei por um amigo que estava assistindo, ele gritou: Faltam só 40km! Para quem havia corrido no máximo 21km na vida foi um “belo” de um incentivo, segui correndo por 24km, a partir daí os joelhos começaram a ranger e pior, doer, bem como os tendões, jamais haviam suportado tamanho esforço, mas aquilo era pouco para me abater, passei a andar e correr, sempre me alimentando nos pontos de abastecimento, de uma hora para outra os quilômetros percorridos parecem multiplicar-se, a satisfação de estar fazendo a prova era tanta que eu passei a desfrutar daqueles momentos, a dor passou a ser prazerosa, o grito de incentivo das pessoas era emocionante, os amigos satisfeitos com minha performance, como é bom o dia do Ironman, faltando 5km, comecei a chorar sem parar, sozinho a um frio de 14 graus aproximadamente, no escuro de uma estrada ao redor da cidade, lá estava aquele “garoto” que sempre classificou o Ironman como um sonho impossível e distante, e agora só me restavam 5 quilômetros, chorei tanto que na linha de chegada já não tinha mais lágrimas, só a felicidade de ter completado a prova máxima de minha vida esportiva, fiz sem preocupação de tempo ou colocação, poderia ter sido uma hora ou duas mais rápido, mas queria tanto terminar que sempre poupava energias para o final, consegui, sou um Ironman!!!Parabenizo a organização da prova, perfeita em todos os sentidos e a todos que me aturaram durante 5 meses de treinamento árduo, foi um período de auto conhecimento e que certamente me deixou bem mais preparado para os obstáculos que a vida oferece, as 14 horas de prova foram sofridas, com dor, mas sem dúvida me mostraram que quando um ser humano realmente almeja um objetivo e luta para alcança-lo com paixão e disciplina, o resultado positivo será uma certa conseqüência, valeu demais!!!
3 Comments:
Kal,
Parabéns por este glorioso sonho realizado! Sua conquista não emociona apenas a você, mas a todos, atletas ou não, que precisam enfrentar diversas formas de "iromans" na vida. Hoje você sai do papel de sonhador para o que dá o exemplo. Abraços.
Parabéns Campeão !!!!!
Esperamos por vc, em nossa piscina, para uma racha bem descontraído.
Um grande abraço
Kal Aragão,
Tem meu respeito e amizade, sua força contagia a todos nós e sua mensagem nos faz crer que tudo é possível de ser realizado.
Força meu amigo! Vamos agora vencer o Ironmam do dia a dia onde o percurso é ainda maior e conta com obstaculos e adversidades desconhecidas.
Parabens e obrigado por ter representado o Ceará e os amigos tão bem.
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