Quem nunca ouviu falar de Ricardo, Kiko e Felipe Perrone não sabe nada do Polo Aquático brasileiro. Os caras foram onde quase ninguém foi e chegaram a ser campeões, pai e filhos, jogando juntos. Eles, no entanto, não são os únicos a desfrutar o esporte em família. Há diversos outros casos de irmãos dentro do Polo Aquático em todos os tempos como os Reis, Sanchez (que tinha ainda um sobrinho), Chaia, Vergara e tantos outros.
O que acontece na Bahia vai além. Pela quantidade, lembra muito mais um clã de outro esporte: os Gracie no jiu-jitsu. Na família Albuquerque é assim: nasceu homem, vai jogar Polo Aquático. Que eu saiba apenas as meninas não aderiram. A entrevista abaixo é com um dos mais entusiasmados na casa da bola amarela. Diego batalha pelo retorno da modalidade em Salvador, é um dos idealizadores e maiores incentivadores do Circuito Nordeste/Centro-Oeste e está sempre pronto pra viajar, mesmo que sozinho, pra jogar onde for. Conheçam um pouco mais desse grande amigo:
Polo Ceará - Vocês estão formando um verdadeiro clã no polo aquático baiano. Quantos da família já jogaram ou jogam?
Diego - A família é grande e o pólo é uma diversão para todos. Ao todo são 09 que pelo menos já jogaram. Os tios André (41 anos), Guga (40) e Paulinho (37). Eu (24) e meu irmão Lucas (27) e os primos Alexandre (22), Jorginho (17), Caio (16) e Gustavo (13). Desses só o Guga que não joga mais por ter colocado uns parafusos no ombro depois de uma queda de moto. E a tendência é aumentar o número de jogadores. O André já tem dois filhos, um de 05 e outro de 02 anos, e por aqui ninguém tem dúvidas qual esporte eles vão seguir. O pessoal até brinca (exageradamente é claro) que os Albuquerques são os Perrones da Bahia. Polo Ceará - Seu tio, ex-goleiro do Tijuca (RJ), começou o movimento. Conte como foi esse início dele no polo aquático e em que nível ele chegou.
Diego - Quando eu ainda nem fazia pólo o André já estava deixando os treinos, mas ainda me lembro do pessoal irritado nos coletivos porque a bola simplesmente não entrava. André começou aos 16 anos treinando com o Pedro Amazonas. Ele já tinha boa natação, mas devido a sua envergadura foi virar goleiro. Aos 18 anos foi 3º colocado em um campeonato brasileiro de seleções estaduais e foi convocado pela 1ª vez para seleção brasileira, para ser banco do André Pará.
Por infelicidade foi cortado devido a um estiramento na virilha. Mesmo assim passou uns tempos treinando no Rio. Algum tempo depois André foi convocado para seleção que iria disputar o PAN de 91. Mais uma vez o azar cruzou seu caminho. Há uma semana da viagem André caiu da moto e quebrou a clavícula. Depois disso o pólo aqui na Bahia já havia parado, pois o Pedro Amazonas teve que deixar o esporte por problemas de saúde. Atualmente André mora em Madrid-ESP com sua família e vai começar a dar aulas de pólo para um time feminino.
Polo Ceará - Como foi a implantação do Polo Aquático em Salvador. Que dificuldades vocês encontraram?
Diego - Já ouvi dizer que o pólo na Bahia começou lá pela década de 60 ou 70, quando o Pedro Amazonas ainda era jogador. Depois o Pedro virou técnico e foi quando ele treinou meus tios (todos goleiros). Depois que Pedro deixou o pólo, André já como técnico assumiu em meados de 94 e montou um time de garotos (eu, meu irmão, etc etc). O grande problema sempre foi a falta de apoio e o descaso. Sem falar nos poucos lugares possíveis de se praticar. Em Salvador só existe uma piscina olímpica. Nossos treinos são no falido Clube Baiano de Tênis, mas aos trancos e barrancos fomos nos estabelecendo. André deu um enorme sangue para reerguer o pólo e quase que não recebeu nada em troca. Hoje em Salvador o pólo respira um pouco, graças à etapa realizada aqui e aos poucos jogadores que permanecem. Mas me preocupa o futuro. Tenho muita esperança que Léo, um cara que cresceu comigo respirando pólo e hoje é professor da UFBA de Educação Física possa levar a garotada pra frente. Ele tem bons projetos.
Polo Ceará - Quais foram os momentos mais marcantes do Polo Aquático em Salvador?
Diego - O Pólo da Bahia do final da década de 80 era quase que imbatível na região. Chegou a ser 08 vezes campeão N/NE.
Quase 10 anos depois, o time que eu jogava levou 03 anos de ferro nos N/NE, depois disso passou a colecionar títulos e foi 04 vezes campeão N/NE (99,2000,2001 e 2002), ganhando final de campeonato por placares como 14 X 0. Mesmo com a superioridade regional da época, sempre foi gritante a nossa inferioridade em relação aos times de Rio e São Paulo. Disputamos 2 brasileiros e só conseguimos ganhar apenas uma vez para uma seleção de Brasília. Os outros jogos sempre tomamos balaio.
Outro momento mágico do pólo aqui foi poder rever um grande campeonato realizado em Salvador, como foi a 2ª Etapa. Polo Ceará - Aí na Bahia tem também Polo Aquático em Feira de Santana. Vocês fazem esse intercâmbio?
Diego - O pessoal de Feira sempre teve um pólo forte, inclusive com fama de briguentos. Por isso sempre houve uma rixa muito grande dos times daqui com eles. Atualmente lá está muito em baixa. Ainda não foi possível fazer amistosos com eles por falta de disponibilidade de ambos. Mas vale lembrar que no Circuito nosso time tinha 02 jogadores de Feira de Santana. Polo Ceará - No primeiro evento de retorno da Bahia, além de você, cujo o potencial já conhecíamos, tinha o Silvio, canhoto muito eficiente, um centro forte e um time, que mesmo destreinado, era obediente taticamente, priorizava a marcação e manteve um padrão de jogo bem legal em todas as partidas. Como o time sentiu a volta à piscina?
Diego - Muita alegria e muito cansaço. Alegria por juntar duas gerações no mesmo time e cansaço pela falta de preparo. Mas o time era experiente e conseguiu fazer um bom papel levando em consideração as condições. André jogou de linha, como último homem. Quem é o goleiro atualmente é Paulinho. O Silvio (canhoto) dispensa apresentações. Junto com André ele também já foi convocado para seleção brasileira. Hoje está com uns quilinhos a mais, só que ainda é difícil “marcar o véio” como ele mesmo fala. Silvio é pólo-arte, jogadas impressionantes e eficientes. Eu tiro o chapéu pra ele. Polo Ceará - Como foi que você conseguiu tanta mídia pro evento de Salvador?
Diego - Realmente não foi fácil. Contei com o Know-How em eventos da Rinha Comunicação Total, uma agência de publicidade que sou sócio. Contei também com a ajuda de um amigo administrador, o Rodrigo Paolilo. Ele é um experiente gestor de projetos, além de ex-atleta. Com isso, pudemos fazer uma série de contatos e elaborar uma proposta clara para o campeonato. Assim conseguimos o apoio da TV Bahia que foi vital para alavancar o ressurgimento do pólo no estado. Mas confesso que mergulhei de cabeça neste projeto, dei um verdadeiro sangue. Para quem quer mídia é importante mostrar como o patrocinador ou apoiador vai sair ganhando. Seja claro e objetivo sem fantasiar demais. O pólo não vende igual a futebol, mas tem seu lugar para a comunidade esportiva, é só saber negociar. Polo Ceará - Você, se morasse no Rio ou em SP, com certeza chegaria a um alto nível pelo seu biotipo, boa natação, chute forte e extrema dedicação ao polo aquático. Fale sobre sua evolução no Polo Aquático, passando pela experiência no Canadá e suas perspectivas.
Diego - Quando eu era mais novo meu sonho sempre foi chegar um dia à seleção brasileira. Infelizmente não aconteceu. Não sei se morando no Rio ou em São Paulo eu chegaria à seleção, mas garanto que ia me esforçar ao máximo, e acredito que chegaria a um bom nível competitivo pelo meu esforço e dedicação. Só que daqui de Salvador hoje em dia, simplesmente NÃO DÁ!
Eu comecei no pólo aos 13 anos, quando meu irmão e meu primo já jogavam. Eu vim da natação e isso facilitou minha maneira de jogar. Mas nunca me achei um jogador destacado. No começo eu até achava que André me escalava no time só porque era meu tio. Uma vez o Cabral do Rio me elogiu num brasileiro como um dos 20 melhores jogadores do campeonato e eu achei que era só pra eu não desanimar. Talvez tenha até sido rsrs, mas aos poucos fui ganhando mais confiança, até ser o capitão do meu time júnior.
Estudei 03 meses em Toronto no Canadá. Fiz um teste e passei no time da York University. Pra mim era um sonho ver tudo organizadinho, com varias pessoas jogando. Eu treinava com um time juvenil e um adulto. O adulto tinha 02 caras que jogaram na seleção canadense e o goleiro era da seleção junior. Disputei a Liga de Ontário, jogando por 2 times ao mesmo tempo: O da York University (2ª divisão) e o Mavericks Water Polo (1ª Divisão). O nível de Rio e São Paulo não fica muito atrás, porém lá existe uma variedade muto maior de jogadores bons, sem falar na organização. Agora o feminino canadense dá show! Joguei algumas das melhores partidas de minha vida, mas depois do campeonato tive que voltar para o Brasil e concluir os estudos. Lá em Toronto era muito difícil conseguir bolsa para ficar por lá.
Polo Ceará - Ouvi dizer que um primo seu que joga na Espanha brilhou em Recife. A família quer dominar o mundo? Fale sobre a experiência do seu primo.
Diego - Como você adivinhou que nosso plano é dominar o mundo? Hahaha.
Mas de fato, não me lembro de nenhum campeonato que tenha jogado com Alexandre que ele não tenha sido o artilheiro do time. Ele é um matador! Ele sim, se tivesse oportunidade de morar no Rio ou São Paulo chegaria à seleção brasileira com certeza. Hoje ele trabalha em Sabadell na Espanha como Salva-Vidas e quando pode sempre vai aos coletivos no clube onde a equipe do Sabadell treina. As vezes até treina com os profissionais. Mas para ele se profissionalizar por lá teria que passar uns 04 meses só treinando o dia todo pra pegar ritmo. E como ele precisa trabalhar pra se sustentar, fica mais difícil.
Polo Ceará - Você é um dos idealizadores e maiores incentivadores do Circuito. Qual a sua expectativa pros próximos anos de Circuito?
Diego - Saber que o Circuito está vivo é um alívio. Tenho um desejo de viver com o pólo constantemente na minha vida. Que eu possa ir jogando campeonatos assim até ficar velhinho. E o Circuito é uma realidade. Acredito que se continuarmos tratando-o com esta importância, logo logo vai andar com as próprias pernas e crescer ainda mais. Mas por enquanto é preciso alguns sacrifícios que futuramente serão recompensados. Quando estava organizando a etapa daqui ouvi muitas coisas que tive que engolir a seco para não desanimar. Gente que se diz à favor do esporte, mas não faz nada para ajudar e as vezes só atrapalha. E toda vez que falavam “largue o pólo, isso não bota comida na mesa” eu respondia “para mim o pólo não bota comida na mesa, mas alimenta o coração” e é isso que eu acredito. Portanto, não tem como não acreditar no sucesso de um Circuito feito por pessoas que realmente amam pólo.